Nas esquinas da vida...

"Se o tivesse escrito para procurar o favor do mundo eu teria me ornado de belezas emprestadas ou teria me apresentado com minha melhor pose. Quero que me vejam aqui no meu modo de ser simples, natural e ordinário, sem afetação nem artifício: é a mim mesmo que pinto". (M. de M.)

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Deus de estimação




Hoje quando acordei pedi ao meu deus de estimação que me concedesse alguns desejos. Comecei pedindo um pouco de sossego, em algum lugar onde eu pudesse ser eu mesma, sem estereótipos, sem convenções, regras, falso moralismo, contas a pagar. Somente eu, meu cabelo ao vento, sem maquiagem e o amarelo queimado do sol se deitando no horizonte. Pedi também que, por favor, não me permitisse vencer na cidade, nesta selva de clichês, pedra e cansaço. Não serei feliz, tenho certeza, que ele me leve para longe, longe das exigências, cobranças, mentiras, necessidades, vontades e solidão da parede quente do apartamento.
 Coloquei os pés no chão, as mãos na beirada da cama e observando meus dedos segui com meus pedidos em pensamento. Sei que preciso levantar hoje, trabalhar, estudar e encontrar pessoas que não gostam de mim (e fingem gostar), algumas que me amam (mas, infelizmente não posso corresponder), que não desejam nenhum pouco me conhecer (e talvez eu queira), mas “livrai-me do mau amém”, meu resquício de cristianismo. Levantei e caminhei até o espelho do banheiro, estou irreconhecível. Cabelos compridos e cacheados, rosto mais largo, dentes sem aparelho corretivo, com apenas dois pares de brincos nas orelhas e muitas pintas no rosto ocasionado pelo excesso de sol. Mas, estou feliz. Feliz por não me exigir vestir 38, por não ter cabelos lisos (que um dia quis tanto), por não ser perfeita! Feliz por ser quem sou, assumir meus desejos e vontades diante de tanta hipocrisia, imoralidade, insanidade e desejos mais sórdidos escondidos em discursos convencionais.   
Abro a porta da rua, porém, me canso só de observar o mundo que passa lá fora e as pessoas que o compõe. Preciso mesmo ir deus? Inconscientemente, respondo por ele dizendo que sim. As contas não se pagam sozinhas e algumas pessoas dependem do meu estado de sobriedade mental para também ter coragem de levantar de suas camas e seguir. Mesmo estando num estado completo de asco social, sai pela rua desejando bom dia por quem passo.
Já no ônibus, observando as pessoas pela janela, peço mais uma vez ao meu deus de estimação para que ele não esqueça os meus pedidos. Realmente, não desejo estar aqui, não fui feita para esse mundo, penso e esboço um sorriso sarcástico. Pretensão? Não! Honestidade! Deixo-o para os fortes, decididos e perfeitos! Se bem, que não vou muito longe de tudo isso que quero fugir, mas ao menos consigo ver no que fui colocada. E posso rejeitar. Tentar.
Mais um dia daquilo que não desejo eu vivo. E meus pedidos persistem no meu consciente latentes! Que mais um dia meu deus não esqueça de mim.  


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