Nas esquinas da vida...

"Se o tivesse escrito para procurar o favor do mundo eu teria me ornado de belezas emprestadas ou teria me apresentado com minha melhor pose. Quero que me vejam aqui no meu modo de ser simples, natural e ordinário, sem afetação nem artifício: é a mim mesmo que pinto". (M. de M.)

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Por onde tu querias andar?


Já estava com saudades de estar aqui.
Semana cheia.
Trago um continho que encontrei guardado...
Espero que gostem!





Noite quente, não consigo dormir e tão pouco assistir o Corujão. Olho a rua pela janela, tudo calmo. Vou sair. Pegar um ar. Aqui estou sufocado.   
Já na rua. Avisto aquela silhueta arredondada, cabelos negros, boa carnuda. Bela morena. Do sinal fechado observo a bela perdida na noite, tanto quanto eu. O sinal abre e parto, ainda a observo pelo retrovisor. Descido voltar e me aproximar.
Ela é experiente, charmosa, conhece bem seu trabalho. Aproxima-se do carro com um rebolado insinuante, debruçando-se sobre minha janela, deixando-me amostra seus belos seios. Negocia comigo. Me deixando louco. A convido para entrar e partir dali.
Enquanto procuro algum lugar para irmos, ela apenas me olha, sorri e com os dedos limpa os cantos da boca tirando o excesso de batom. Ela indica um lugar. Fala que é barato e que podemos ir até lá. Quando dei por mim, estava num motel no submundo da noite, ao lado de uma mulher que não sabia nem o nome. Já estava perdido. Entramos.  
Ela não se importava comigo, apenas com meu dinheiro. Entramos no quarto e ela começou os trabalhos. Deitado na cama observava sua boca ágil, sem sentir uma gota de prazer. Puxando-a pelos cabelos, tirei-a de cima de mim. Liguei a televisão. Entre um canal de sexo e outro, um passava a novela e outros alguns clipes com músicas dos anos 80. Tocava Talking Heads, Burning down the house.  Mandei que a morena dançasse para mim. E assim ela fez. A puxei para mim e a joguei na cama.
Beijando suas pernas formosas. Por entre as coxas cheirosas. Vi algo crescer. Como um homem poderia ser tão belo? A garota tinha um pau. Aquilo me fez perder o apetite.
Depois de descobrir sua verdade. Acendi um cigarro e a fiz fumar. Liguei para recepção e pedi duas doses de tequila. Começava a sentir a pele ferver. Ela na cama, perguntava o que eu procurava afinal. Eu apenas ri. Deixando aquela puta de esquina sem resposta.
Perguntei seu nome. Era Marcela. Era linda. Mas não me deu tesão algum.
Saímos de lá. Não estava satisfeito. Deixei a morena na mesma esquina que tinha lhe visto. E corri estrada. Fui parar num barzinho de beira de estrada, com caminhoneiros e homens de baixo nível. Não me importava. Queria mais uma dose e assim consegui.
Sentado no bar, observava um por um. Dentre eles tinha um baixinho, moreno, sujo, rude, mas que por algum motivo me atraia muito.  Enquanto curtia uma dose. Ele estava altamente bêbado e falante. Vi o momento que ele se dirigiu ao banheiro do poleiro. Chegando lá, encontrei com ele, se aliviando. Não pude deixar de fazer o mesmo. Não sabia ao certo o que queria ali com aquele decrépito.
Enquanto urinava, eu olhava propositalmente para seu pau. O tamanho não me importava. Queria mesmo saber no que aquilo daria. Percebendo meus olhares e pela forma que me retribuía, imaginei que ia apanhar ali mesmo. Mas pelo contrário. Fui puxado pelo braço e “convidado” a sentar em um dos vasos de uma cabine. Foi tudo tão frenético que quando acordei do transe do momento estava chupando aquele estranho.  E pior, estava gostando. A ponto de gozar sem me tocar. Não acreditava. Cai em mim. O empurrei e sai correndo do estabelecimento.
Entrei no carro. E ria. Ria como nunca tinha feito antes na vida. Na boca sentia um gosto peculiar e exótico. Nojo não senti, queria mais. Onde poderia encontrar?
Dei por mim num hospital. Estava vazio. Não tinha pacientes e nem funcionários. Apenas uma loira vestida de enfermeira, com os seios a mostra e com um lingerie vermelha. Perguntou-me se precisava de ajuda. Disse que queria sair, onde poderia tomar um bom drinque. Ela me disse que lá mesmo, pois me serviria um bom conhaque.
Estranhamente de fundo escutava burn down the house...  Senti o gosto forte do conhaque e não desperdicei. Perguntei pelos demais funcionários e pacientes. Ela disse que eu era o seu único paciente e faria tudo que eu quisesse. A convidei para dançar a música, que estranhamente, somente eu escutava.
Na dança as coisas esquentaram. Beijava-a, apalpava seus seios, mordiscava sua orelha, puxava seu cabelo e dava tapas nas ancas. Os beijos se intensificavam, já estávamos na maca, ela de bruços, com o vestido branco levantado...
O despertador tocou. Dez da manhã. Sentia uma dor de cabeça intensa. Gosto estranho na boca. No rádio tocava burn down the house. Estava em casa, de roupas de dormir. Uma calcinha vermelha jogada no chão. Havia sonhado? O que fiz na noite passada?      


terça-feira, 26 de abril de 2011

O dono do morro

Por conta da noite passada, que me rendeu muitas risadas, tapas e mordidas escrevo esse continho. 



"Eu era um imoral, sujo, safado, sem pudor algum" - Conta Raimundo.


Cresci vendo meu pai com os amigos sentados na esquina da rua de casa. Bebendo cachaça, escutando brega no rádinho de pilha, fumando cigarro vagabundo e mexendo com o mulherio que passava.  

Todos eram casados. E as mulheres eram santas de altar. Sempre escutava minha mãe falar pras amigas que Sebastião, meu pai, era o melhor homem do mundo - que deus a livre. Não dava trabalho em casa. Era trabalhador. Sem vícios. E ir a esquina com os chegados e ao jogo do Remo, era a diversão suficiente pra ele. Assim acreditava ela. E fato. Meu pai aparentava ser um senhor muito sério. Era respeitado e temido entre os seus.

Anos depois, já rapaz, conheci outro Sebastião. Chamado de Tião Gavião na noite. De sexta a domingo, quando ela dizia em casa que fazia extra no trabalho, ele seguia para a casa de Dona Mara. O puteiro mais despintado e frequentando das redondezas. Recheado de ninfetas recém-chegadas do interior.

Eu era o mais velho de três irmãos. Cedo meu pai me apresentou esse mundo dos homens. Com quinze anos já frequentava a casa de Dona Mara. Bebia e fumava. Lá conheci Raimundo: “Cínico, decrépito, desgrenhado e gordo”, assim mamãe o chamava.

Vivia na Mara. Paquerando algumas meninas. Apalpando outras. Tomando uma cerveja, com um cigarro no canto da boca. Raimundo era um homem boa praça. Moreno, estilo brutamontes. As meninas o cercavam quando ele chegava. Com ele na casa não tinha puta pobre e nem triste.

Não foram poucas as noites que vi Raimundo trepando, sendo chupado, em posições animalescas. Em público, ao vivo e a cores. O recinto era propício. A "fulegarem" estava no ar. O cheiro era forte, de sexo, cachaça, cigarro e erva. Sem contar, com os peitinhos durinhos que desfilavam de fora. Uma visão dos "infernos".

Certa noite a farra foi interrompida. Bem como meu pai, Raimundo era casado e tinha uma reta de filhos. E todo mundo sabia do seu maior vício: a libertinagem. Era casado com Dona Joana, uma senhora evangélica que lutava para tentar desentortar a vida do marido.

Na noite do dia 1º de maio, quando todos os homens estavam reunidos na casa de Dona Mara, festejando o ócio, eis que a porta é arrombada e uma onda de senhoras com bíblias e velas, seguidas de homens entoando trechos bíblicos, invadem o puteiro, liderados por Dona Joana.

O corre-corre foi geral. Poucas roupas cobriam as partes. Estavam todos trepando no salão principal. Todos os pais de famílias estavam lá. Atracados com ninfetinhas. E no meio da confusão escutávamos: “Sai Satanás”, “Sangue de Jesus”, “Queima” e uma série de outros bordões religiosos... Causando maior alvoroço entre clientes e evangélicos.

Dona Joana procurava loucamente por Raimundo dentro do antro. Gritando: “Quede aquele “do mundo”?”. Enquanto isso, o homem estava fodendo até não poder mais com uma jovem de lindos seios, puxando por seus cabelos e deflagrando tapas em seu rosto.

Quando ela o encontrou ficou chocada e ao menos tempo rezava e gritava pedindo perdão a deus pelo marido ordinário que tinha. Aos poucos, a “rezadeira” deu lugar a lamúrias. E a mulher põe-se a chorar.

No mínimo Raimundo parou a “fodelança”. Mas ao invés de consolar Joana. Passou a xingá-la. O homem não teve pena de sua santa esposa e disparou um turbilhão:

“Sua ordinária. O que fazes aqui? Não sei por que te metes a besta de vim me procurar. Sua vadia. Pois saibas que não te quero mais. Vais virar puta de rua. Dar pra’queles homens que catam os centavos pra comer uma macaquinha que seja...”

Dona Joana humilhada saiu correndo do puteiro. Arrasada.
No dia seguinte, a casa que antes não chamava atenção alguma, amanheceu fechada e com velas e uma bíblia na entrada. Na porta a placa dizia: “Fechada por motivo de desordem pública”. Todos os homens flagrados lá andavam de cabeça baixa pela rua. Somente Raimundo andava de cabeça erguida. Como se nada tivesse ocorrido.

E mais impressionante. Com Dona Joana a tira colo. Um casal perfeito, diria o desavisado. De alguma forma eles se entenderam. Joana e Raimundo viraram uma lenda. Eram citados entre brigas de casais e em  conversinhas de botecos. 

Depois do ocorrido a casa reabriu, para felicidade geral dos homens. As mulheres acabaram aceitaram a condição de santas de altar. Inclusive Joana. E tudo voltou ao normal. Com um diferencial. Mais do que nunca, “o homem era o dono do morro”, como diria Raimundo no dito popular.

Hoje vejo aquele velho sentado na porta de sua casa. Doente. Vez ou outra passo por lá pra saudá-lo. E custo a acreditar que aquele homem velho hoje foi um dia aquele homem vigoroso. Raimundo separou-se de Joana anos depois, pra casar com uma das moças da casa. Mas tudo foi golpe. Ela roubou dele até os discos de samba. Deixando-o pobre na miséria. 

"Tudo o que um dia foi ouro, hoje já não brilha mais" - Ele costuma falar. Vive sozinho. Poucos sabem que o famoso dono do morro de outrora, fora aquele velho. Tornou-se lenda.  

      

domingo, 24 de abril de 2011

Zana



Sim. Atire a primeira pedra aquele que nunca teve uma Rosa na vida. Quem nunca amou loucamente. E cometeu danações.

Hoje estive tocando na viola amor proibido de Cartola, lembrei-me de quando amei Zana. Mulata faceira, de rebolado “gingoso”. Sem pudor, me amava na rua, encostada no muro, com as ancas empinadas. Ai mulata, de tesão quase me enfartou.

Na mesma proporção de prazer, chorei de dor. Quando a encontrava distribuindo charme para os malandros da vila no samba. Pegava-a pelo braço. Arrastava para casa. Dava-lhes umas tapas por onde pegasse. E ao contrário do que se imagina, Zana pedia mais, olhando-me nos olhos. Naqueles dias, depois do amor, chorava de tristeza. Aquele amor me despedaçava.

As palavras de Cartola me assombravam “fácil demais fui, presa servi de pasto em tua mesa”. Mas aceitava Zana como era. Não havia mulher igual. Ainda recordava do primeiro dia que a vi sambar. No dia que comemorávamos nosso amor, lhe comprava rosas. Ela nem sequer lembrava. Mesmo assim a levava para jantar no boteco do Jairo. Escutando “Os bambas” tocarem. Zana levantava. Rebolando. Quando avistava minha mulata no salão. Já estava bem acompanhada de um homem qualquer.

“Faço tudo para evitar o mal, sou pelo mal perseguido”... Certo dia, depois do trabalho. Vinha pela rua cantarolando. Naquele dia havia recebido o salário do mês. Tinha comprado para minha mulata um vestido novo para o samba de domingo. Estava ansioso para vê-la nele.

Cheguei em casa. Percebi certa movimentação que vinha do nosso quarto. Olhei pela fresta da porta. Foi meu fim. Encontrei Zana nos braços de outro. E pior de tudo, era Manoel. Meu irmão.

Estavam em nossa cama, num amor insano. Ela gritava, gemia, urrava. Pedia mais. Mais tapas. Mais prazer. Fazia questão de fazer barulho. Não tiveram tempo de notar minha presença (*).

Eu bem conhecia aquele jeito de amar. De explodir em gozo e suor.
Sai do quarto arrasado. Dolorido o peito. Amargurado.   
Sem entender meus sentimentos. Excitei-me com a traição. Deu-me vontade de acender um cigarro e olhar. Simplesmente olhar (*).
Porém sentei na salinha. Pensei que talvez fosse por isso que ainda estava com aquela ordinária que tanto amava.

Num só tempo. Fui até a cozinha. Peguei uma faca.
Entre no quarto. Puxei Zana pelos cabelos e dei fim ao seu prazer de viver.
Assim fiz com Manoel.
Foi assim. O fim de todos...

(*) Inserções especiais de Felipov =D. 

sábado, 23 de abril de 2011

Zenaide



A hora é das putas (sem querer soar pejorativo). Como fez meu comparsa Felipov, com sua Maricota. Trago aqui Zenaide. Apreciem.  




Apreciava samba. Mas adorava A-ha.  Seu quarto era simples, com paredes recheadas de fotos da banda.
 Cobrava 30 reais por hora. Sempre questionei seu preço, já que valia muito mais. Ela dizia que isso bastava para sustentar seu vício.
Fazia de 5 a 7 programas por dia. Quando chegava minha vez, encontrava-a sentada na janela, fumando um cigarro e com um copo de vinho barato e seu A-ha no rádio.
Aparentava cansaço. Nem sempre me deliciava daquele corpo moreno e cheiroso.  Adorava sua companhia. Ao invés do sexo, pedia pra ela fazer o que quisesse. Eu ficaria observando.
As vezes fodíamos loucamente. As vezes cozinhávamos. As vezes fazíamos nada.
Sonhava em ser cantora. Falávamos sobre isso por horas. Não tinha o médio completo. Mas tinha certa cultura adquirida na vida. Gostar de A-ha era uma delas.
Seu maior conhecimento estava na cama. Aquela morena sabia como deixar um homem de pau duro e explodir em gozo. Já tinha trabalhado em vários puteiros. Agora estava livre de cafetões e bordéis baratos.
Com seios pequenos, bicos escuros. Ancas arredondadas. Cabelos negros, levemente ondulados. Coxas formosas e macias. Pelinhos claros. Levava-me ao paraíso.
Certo dia. Cheguei ao prédio vermelho onde morava Zenaide. Vi certa movimentação na entrada. Algumas senhoras choravam, outras pessoas conversavam. Fui impedido de entrar.
Perguntei a um senhor o que acontecia. Ele me informou que a moça do 7 tinha cometido suicídio. Perguntei se era Zenaide. Ele disse que sim.  
Depois que a polícia foi embora levando o corpo dela. Pedi pra entrar no quarto. Disse ser da família.
As coisas estavam pelo chão. As fotos da banda preferida rasgadas. Louças sujas. A janela aberta. O dia estava lindo. Sentei-me no sofá. Fiquei contemplando aquela bagunça. Coloquei A-ha pra tocar.
“O que teria acontecido?” – Pensei.
Foi quando vi um bilhete debaixo do vaso de flores. Nele ela dizia:
“Jaime, sei que és o único que vais ver isso. Saiba que te amei. Porque me amaste também. Conheceste bem mais de mim do que a puta que fui. Meu nome de verdade é Maria. Apesar de tudo que vivemos. Sinto minha’lma vazia. Prefiro dormir e não acordar mais. Do que ter que acordar para com mais homens me deitar, sem prazer, sem amor.”
Mais do que a puta que foi. Via em Zenaide uma menina. Perdida na vida. Parece até que veio pra terra por engano. Sai do quarto. Olhei pela última vez para o recinto e bati a porta...

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Ao acaso...



Ela
tinhas as unhas e a boca pintadas de vermelho vinho.
Embaralhava cartas no balcão do bar.
Usava um tubinho preto e saltos finos.
Cabelos presos e negros.
Olhos contornados por lápis preto.

Parecia não enxergar um palmo a sua frente. Era indiferente com todos naquele recinto sujo. Sabia que todos a olhavam, buscando responder uma única pergunta. Quem era aquela mulher misteriosa?

Do outro lado do bar estava um homem.
                         Usava calças marrons e blusa de linho rosa.
Olhava no relógio com frequência e fumava cigarro importado.
                         Parecia esperar por alguém.

Apesar de estranho, não chamava mais atenção do que aquela linda mulher. Ela também parecia esperar por alguém. Mas ao contrário do homem, ela não tinha pressa. Apenas aguardava o momento. Enquanto isso, o bar enchia de clientes e prostitutas em busca do “ganha pão”. Por volta de 10 horas o homem de calças marrons fora embora e a mulher de tubinho preto permaneceu.

Mas não por muito tempo, até a chegada de um homem, boa pinta, com ar fanfarrão e exibido. Sua arrogância e confiança eram enormes que ele nem notou a mulher sentada no bar. Agora não mais embaralhava as cartas e dava total atenção àquela figura. Assim que ele sentou-se no bar e fez seu pedido. Ela organizou as cartas e colocou-as no balcão.

Tirou de entre as pernas, uma arma e se aproximou do homem.
Atirando diretamente na cabeça do sujeito sem pestanejar.
Todos ficaram assustados e uma gritaria tomou conta do lugar.  

Ninguém sabia exatamente o que tinha acontecido.

Entre as pessoas correndo, vi a mulher assoprar no cano do revolver e cutucar com o pé o corpo do infeliz, como se tivesse certificando-se do seu estado de morte.

Após isso, saiu tranquilamente - aparentando feliz - do recinto. 
Não sendo mais vista.

Devaneio inacabado...



Fato, esse aqui é inacabado! Mesmo assim, trago para deleite. 


E o que era se não mais que um corpo?
Esculpido pelo tempo.

“Rústico, uma grossaria só, imoral”. 

Mãos grossas de trabalho pesado.
Pés largos do descalço.
Altura mediana.
Suavemente acanelado.
Lábios grossos.
Olhos castanhos.

“Rigoroso, fula”.

Era assim Jubileu. Aquele homem que avistara.
Desarrumado.
Tez grossa. Aparentando fulo.
Mas de um sorriso largo...
Barba rala e mal feita. Que vez ou outra ralava a mão.

“Pecado, castigo, eterno martírio”.

Meus olhos desejosos queriam mais.
Pra que tudo aquilo de beleza?
Banhado de suor. Peito forte.

“Devaneios, desejo”. 

Simplesmente não queria desviar o olhar....



quinta-feira, 21 de abril de 2011

“Aquela mulher até hoje está me esperando...” Parte 2



Lindo nome não? Passaram-se semanas e eu ainda pensava nela. Mas não me esforçava em procurá-la, não era de insistir, nem pensei que teria chances. Mesmo, não pretendia alimentar sonho em vão, estava fugindo deles. Já sofrerá demais por amar quem não me correspondia.  

Voltei a Traça, livraria onde tinha visto pela primeira vez Valentina, sem intenções de encontrá-la. Entrei e fui até os livros de poesias eróticas. Ficavam nas estantes ao fundo. 

Dirigia-me para os livros, dobrando numa das grandes estantes na livraria, dei de encontro com ela. Derrubando os livros que trazia consigo. Pedi desculpas e ajudei-a juntá-los. Ela era tão gentil, meiga, cheirosa, apenas sorria, enquanto, eu pedia deveras desculpas pelo ocorrido. Ela dizia: “Tudo bem, não se preocupe, isso acontece!”. Não, isso não acontecia comigo.

Para minha surpresa entre os livros que ela carregava, estava o de Anaïs Nin, “Henry e June”. Eu adorava aquele livro. Olhei para o livro e disse: “Que bom gosto, este livro é ótimo, vais adorar”. 

Ela sorria sempre. E me disse: “Sério? Fiquei em dúvida se levava este. Mas já que você me indica com tanta certeza e prazer, eu o levarei. Obrigada”. E saiu andando. 

Nossa, ela estava levando um livro por minha causa, pensei! Bobagem! Rindo atoa com aquilo que acontecerá, passei a noite pensando naquele sorriso e perfume que me inebriaram. Ela cheirava a rosas brancas inglesas.   

Alguns dias de passaram. Lá estava eu, na Traça, folheando alguns livros policiais que tinham acabado de chegar. Quando senti aquele perfume característico, único e um toque suave sobre meu braço, era ela. Com o olhar brilhante. Pedindo-me licença e desculpas por me incomodar. Como se ela conseguisse isso. 

Falou sobre o livro de Anaïs Nin, agradeceu pela indicação, disse que adorara o livro. Fiquei ali, sem saber ao certo o que responder. Mas claro, respondi. Não poderia perder essa chance. Assenti com a cabeça e disse que realmente estava feliz por saber que ela havia gostado da indicação. Ela se apresentou, falando que seu nome era Valentina e que apreciava este tipo de literatura.

Dali para tudo que viria, era apenas o começo. Neste dia, passamos a tarde conversando. Foi divino. Supremo. Sublime. Tão sublime, que me levou ao fim.

Depois desta tarde, muitas outras vieram. Noites também. Passamos a ir ao barzinho da praça, nosso outro refúgio. Eu a venerava, sem demonstrar meus interesses, adorava o modo como ela falava e gesticulava.

Certa noite, saímos do bar. O álcool fazia nossas cabeças. E falávamos de música. Ela disse que adorava Cartola, em especial, “cordas de aço”, dizia ser sua música predileta do sambista. Tropeçando pelas calçadas caminhávamos. Determinado momento, nos abraçamos. Pude sentir sua cintura fina e seu cheiro. Aproveitava-me da situação para apertá-la contra meu corpo. Podia sentir o vestido de tecido leve deslizar entre minhas mãos e sua pele. 

Valentina estava com o braço no meu ombro. E assim íamos. Quando ela começou a cantarolar: “ e, no entanto meu pinho pode crer, eu adivinho aquela mulher até hoje está nos esperando...” e eu completei “solte o teu som da madeira, eu você e a companheira, na madrugada iremos pra casa cantando...”.

Neste instante ela virou de frente, com os braços no meu ombro e disse: “Vamos pra casa, cantar e beber mais. Lá tenho vinho tinto e poemas de Neruda”. 

Rindo, eu concordei. Chegando a casa dela. Bem como ela. A casa era linda. Arrumadinha. Lar de intelectual. Com algumas peças de artes e outras de artesanato. Muitos livros e CDs. E claro, muitas fotografias dela, com amigos e família. Eram lindas. Ela me chamou pra sentar no sofá. Pegou o vinho e duas taças e trouxe depois o livro do Neruda como havia dito.

Comecei a rir e disse que nem precisava tudo isso. Teria indo até sua casa por muito menos. Ela sorriu. E levantou para colocar uma música. Era “Tive sim” do Cartola. Ela retornando, sentou-se mais próximo de mim e perguntou: “Você é feliz?”. Não sabia se respondia. Eram 4 da manhã, tínhamos bebido bastante, no entanto, eu sabia a resposta e assim respondi. 

“Semanas atrás eu não era”. Ela me olhou nos olhos e indagou-me mais uma vez: “Por quê? Agora és?”. “Claro que sou eu te encontrei”. Ela sorriu e completou: “Adoro ser sua amiga, estar contigo, me sinto muito bem. És tão inteligente e claro, adora literatura erótica”. Rimos. 

Ela estava tão sedutora. Ficamos nos olhando, quando... 


[isto não é um suspense barato]

Corazón de bandido





Sim. Este sou eu. Nu. Completamente.

Veja se ainda lhe agrada.
Senão, a porta está sempre aberta.
Não estou sendo rude.
Apenas sincero.


Já vivi o bastante pra saber que não posso agradar todos.
Fizemos sexo. Foi delicioso.
Ainda sinto teus afagos e escuto teus gemidos.
Mas foste tu que cansaste.
Não vou me importar se tudo acabar como uma música que chega ao fim.


Sempre vou te encontrar sentada naquele bar. Esperando por alguém.
Não me doe te ver chorar. Não tenho culpa por tua falta de sensatez.
“amor, amor, amor, me abrace mais forte, amor, amor, amor... vem me mostre esse corpo que eu tanto desejo, amor...”
Nossa música. Lembras?
Dizias que eu era teu homem. E hoje, o que sou?

Sabes de mim. Sabes onde me encontrar. Te vais por livre vontade.
Tudo bem pode levar nossos discos e tuas fotos.
Só sentirei falta daquilo que não poderei comprar.
Se isso te fará feliz. Vá.
Mas, feche a porta, por favor. Preciso dormir amor...




terça-feira, 19 de abril de 2011

Delícia de desconhecido...



        Era luar. Estava arrumada. Ia encontrar os amigos. A noite ia ser diferente. Deixei a circunstância me levar e o desejo de algo novo me empolgar.

Os planos não existiam. Mas a vontade de ir fundo sim. Olhei o céu, a lua estava linda. Guiava-me. E obscurecia meu caminho, me levando para o submundo.
Ia sambar. Beber. Fumar. A rua sempre deserta para os amantes e os ladrões. Encruzilhada perfeita para os desavisados. Rumávamos às risadas, cambaleando, e eu jogando charme para os poucos homens que passavam.
Esse não seria um dos melhores contos, mas sem dúvida, umas das experiências mais interessantes. Não conseguiria colocar no papel a sinestesia.
Chegamos ao recinto. Eis que uma briga acontecia. Atravessando a rua, as risadas deram lugar a murmurinhos. Não sabíamos se devíamos seguir, e quando demos por nós estávamos muito bem assentados numa mesa.
Olhávamos o lugar com curiosidade e incredulidade. Os homens eram rudes e as mulheres mal vestidas. Mas algo nos fazia querer mais.
A cerveja chegou. Três copos nos foram servidos. O valor nos era agradável. Cada mesa me pareceu um universo diferente. A clientela era diversificada e com objetivos diversos. Inclusive nós estávamos nesse balanço.
Descobrimos que a briga que vimos na chegada era entre vítima e ladrão. Preferimos não conjecturar. O banheiro parecia coisa de filme norte americano de prostíbulos sem categoria. Ao invés no nojo, senti um estranho prazer. Em cima do refrigerador tinha uma colher de pedreiro. Não sei bem. Cheguei a pegar. Mas não lembro o que veio depois.
Os homens eram bem interessantes. Cada um ao seu modo. Os olhares eram inevitáveis, só lembro o pouco que vi. Até a polícia passou por lá a fim de tratar da briga que acontecera horas antes. Ironia.
A noite seguiu. Depois de algumas garrafas. Saldo total de oito, sendo uma quebrada. A mesa a frente começa seu espetáculo. Os homens que antes cantavam sambas, agora se digladiavam. Não soubemos o motivo. Mas a briga continuou.
 Isso nos pareceu comum. O garçom seguindo uma espécie de cartilha ou ritual, a fim de não perder o lucro, se aproximou recolhendo os cascos e conversando com uma das mulheres que acompanhavam os sambistas bons de tapa. O pagamento fora feito e a briga continuou.
Olhei todos no entorno, ninguém se importava com a briga dos vizinhos de mesa. Todos muito bem preocupados com seus copos e o papo comia.
Decidimos que aquilo já nos bastava. Saímos cambaleando pela rua escura – apenas os mendigos dormiam e poucos carros passavam – tendo a certeza que aquela experiência seria a primeira de muitas.    
  

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Noites na vida...



Sorria.

Caminhava no rumo de casa.

Estava sozinho.

Madrugada cantava.

As prostitutas da esquina tinham encerrado expediente.

Tropeçava pela calçada.

Não sabia das horas.

Lembrava pouco daquela noite.

O caminho era cada vez mais escuro.

“não sou eu quem me navega, quem me navega é o mar”

Isso era verdade.

Um maço amassado de cigarro no bolso da camisa.

Tinha o último. O da misericórdia.

Quando traguei. Senti me invadir um amargor.

Ao invés da escuridão, vi um clarão.

Estava cego, doido ou somente porre demais?

Um sentimento de angustia me tomava.

Com o braço sob o rosto. Tentei ver o que vinha.

Apenas escutei a buzina do caminhão e o clarão invadir minha’lma.

Tomado por uma força, fui jogado em direção à mureta.

Não sentia meu corpo. Estava morto, pensei.

Levantei e vi meu “casco” no chão, ensanguentado e quebrado.

O maço de cigarro estava caído ao lado.

O apanhei e para minha alegria, não tinha visto bem.

Restava mais um [O do recomeço].