Esse é um dos contos que fiz com amor e aperto no coração... Apreciem.
Quatro da tarde de uma quarta-feira. Do quintal, diante do tanque avistava as demais casinholas, as pessoas passando na rua – indo e vindo – e o sol, que lindo estava, deitando-se sobre a tarde.
No portão o cachorro latia familiar. Pensei ser João. Mas era Pedro. O olhei assustada. E andei na sua direção emocionada, dando-lhe um forte abraço. Ele me retribuiu o abraço e disse: “Eu disse que voltaria”. Nem tinha me enfeitado. Estava com as roupas molhadas. Mesmo assim ele disse: “E tu mulher? Continuas linda”. O levei para os fundos do barraco, o servi do melhor que tínhamos, dando-lhe um pouco de cachaça e um bom cigarro de palha.
Pedro já não era o mesmo. Estava mais magro que de costume, com uma nova cicatriz no rosto, olhos fundos, contudo, falante como sempre. Depois de saborear sua dose, perguntou por João e Carlos. Sentia saudades dos irmãos. Porém estes trabalhavam na nova construção do bairro.
Não demorou nem trinta minutos em casa e Pedro rumou para rua. Lá na esquina de sempre, encontrou os amigos e os companheiros de baralho, cachaça e samba. Neste dia, não o vi mais. Apesar de sentir por ele algo especial, sabia que seu coração não me pertencia.
Soube no dia seguinte que Pedro festejara sua liberdade, bebendo e brindando com os seus. Porém, algo mais me amargurava. Soube que ele recebera uma ligação dela. Aquela pela qual ele jurava amor quando estava no transe causado pela cachaça. Eu cuidava de Pedro, o colocava para dormir, comer e lavava suas roupas. Mas era por ela que ele vivia, se arriscava e dizia querer errar.
Pedro chegou em casa com o nascer do sol. Caia de bêbado, veio carregado pelos comparsas. Como de costume: o coloquei para dormir e preparei a sopa. Sabia dos gostos daquele homem. Fiquei observando seu semblante sereno. Em nada parecia aquele de antes.
Lá pela tarde, quando o sol caia. Pedro acordou. Escutava seus passos pela casa. Chegou à cozinha e gritava por mim. Fui lhe servi. Coloquei a sopa e um copo de água bem gelada do lado. Sem dizer uma palavra. Parecia de mal humor. Também não disse nada.
Rumou para salinha do barraco. Colocou seu disco preferido do Cartola, Tive sim, e lá acendeu um cigarro. Percebi que estava pensativo. Fiquei preocupada. Será que ele tramava algo. Logo chegou Carlos, saudando o irmão, falando coisas triviais.
Por algum tempo não dei atenção ao assunto dos dois irmãos, até escutar certo nome de mulher, que bem conhecia. Pedro parecia mais animado e feliz. Via no seu sorriso o quanto aquela mulher representava para ele. Fiquei cabisbaixa, escutando ele falar que melhor que a liberdade, era saber que ela se importava com ele.
Logo depois do papo, os dois saíram. E música seguinte do disco consolava-me: Nada consigo fazer quando a saudade aperta, foge-me a inspiração, sinto a mal deserta... E assim fiquei vendo a noite ‘tomar de conta’ do dia e de mim.
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